sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Orhan Pamuk - O Museu da Inocência



Em termos formais estamos perante um romance perfeito; a estrutura da obra é muito bem conseguida, dividida em cerca de oitenta pequenos capítulos e com uma coesão interna em termos de enredo que fazem deste livro um romance agradável de ler, mau grado o seu grande tamanho.

O pano de fundo é fornecido pela Turquia do último quartel do século XX (a maior parte do enredo passa-se em 1975). Este país, encruzilhada entre a Europa e a Ásia vivia uma época de grandes conflitos internos. Para lá dos eternos e conhecidos conflitos religiosos, vivia-se uma fase de quase guerra civil, com confrontos frequentes entre extremistas de direita e de esquerda. Perante isto, o governo respondia com um autêntico estado de sítio, com recolher obrigatório e um poder discricionário por parte das autoridades.

É sobre este pano de fundo que decorre uma história de amor marcada pelo insucesso. Kemal, o herói do livro, é o homem ofuscado pelo amor por Füsun, doze anos mais jovem e, pior que tudo, proveniente de um grupo social inferior. Estamos assim perante o tradicional confronto com a sociedade que nos seus extratos mais altos aceita mal esta união mas, muito mais que isso, estamos perante uma união frustrada pelo destino; esta frustração, aliada a um amor alienado, conduzem Kemal a esse projeto que ele vai pondo em prática de colecionar tudo o que direta ou indiretamente dizia respeito a Füsun, colecionando milhares de objetos que constituirão o seu Museu da Inocência.

Por trás deste enredo está uma magnífica reflexão sobre o destino humano que por vezes construímos sobre sonhos que se revelam quimeras. Despersonalização e Intemporalidade são dois palavrões que podem servir de síntese à mensagem deste livro. Kemal submete-se a um sentimento que, paulatinamente, vai tomando posse de si, da totalidade do seu ser. Nada mais faz sentido fora daquilo que se relacione com Füsun. E Kemal escraviza-se ao sentimento. Despersonaliza-se.

Por outro lado, ao contar a história na fase final da sua vida, é nítido o imenso peso do passado na vida de Kemal; esse tempo passado é outra forma de escravatura: a tirania do tempo a contribuir para a anulação do Eu. E Kemal procura essa intemporalidade; procura como que uma eternização do passado, uma negação da mudança, uma paragem no tempo; uma intemporalidade. O recurso ao cinema é outra metáfora usada pelo autor para reforçar essa ideia de intemporalidade: os filmes são uma forma de manter o passado presente, da mesma forma que o museu; ao optar pelo colecionismo de tudo quanto se relacionasse com Füsun, Kemal não procura mais que essa intemporalidade, esse perpetuar da sua própria despersonalização. Na página 509 desta edição Presença, o autor usa uma expressão que de uma forma muito bela sintetiza o estado de espírito de Kemal: "PRESO NUM SONHO".

sábado, 9 de outubro de 2010

sexta-feira, 1 de outubro de 2010